O HOMEM COM CABEÇA DE ÍBIS


HOME PAGE
O ÍBIS É UMA AVE PERNALTA DE bico longo e recurvado. Existe uma espécie negra e outra de plumagem castanha com reflexos dourados, mas era o íbis branco, ou íbis sagrado, que era considerado pelos egípcios como encarnação do deus Thoth. Esta ave tem parte da cabeça e todo o pescoço desprovido de penas. Sua plumagem é branca, exceto a da cabeça, da extremidade das asas e da cauda, que é muito negra. O historiador grego Plutarco (c. 50 a 125 d.C.) afirma que uma das causas pelas quais os egípcios adoravam essa ave residia no fato de a variedade, disposição e mescla de suas plumas negras e brancas oferecerem a imagem da Lua arredondada, quando a vemos na dimensão de seus três quartos, o que pode fazer sentido quando lembramos que Thoth era uma divindade lunar. Outro motivo seria o serviço que o íbis prestava destruindo gafanhotos, lagartas e répteis de mordida mortal. Um homem com cabeça de íbis era outra das representações daquele deus. E é ele que vemos na figura acima, espargindo a "água da vida" sobre a rainha Hatshepsut (c. 1473 a 1458 a.C.), cuja imagem, originalmente à esquerda, foi apagada por Tutmósis III (c. 1479 a 1425 a.C.).

DE ACORDO com a teologia de Mênfis, o deus Ptah seria o criador de todas as coisas. Com forma humana, esse deus concebeu em seu coração todas as formas visíveis e depois as nomeou para lhes dar vida, graças ao verbo criador, manifestado na forma do deus Thoth, o íbis com bico longo cacarejador. As palavras da boca do divino cacarejador fazem existir todos os seres animados, as forças vivas e a organização social. Assim, Ptah, o coração, e Thoth, a palavra, são duas realidades de um mesmo princípio criador. Na figura acima vê-se a foto de uma miniatura em madeira, com 9,6 cm de altura, 16,6 cm de largura e 7 cm de espessura, pertencente ao Museu do Louvre, provavelmente da XXV dinastia (c. de 770 a 712 a.C.), que representa o deus Ptah diante das duas encarnações de Thoth, o íbis e o babuíno. Os gritos naturais do íbis ao nascer e ao pôr do Sol, enquanto permanece ereto sobre as patas, como que em oração, eram interpretados como um sinal de adoração.

EM HERMÓPOLIS, a capital do 15.º nomo do Alto Egito e na qual o deus Thoth era venerado, os íbis, vindos de todo o país, eram mumificados depois de mortos. Nessa localidade foram encontrados os alicerces de um templo consagrado aos íbis e aos babuínos, os dois animais sagrados do deus Thoth. Por trás de seu santuário havia uma espécie de parque zoológico no qual um tanque da era greco-romana devia servir de habitat para as aves sagradas. Arqueólogos descobriram ainda uma necrópole desses animais, profundamente escondida sob a terra. Uma escada monumental com 120 degraus leva à vasta sala de embalsamamento. De todos os lados, estendendo-se por várias centenas de metros, estavam depositadas as urnas contendo os íbis mumificados, num labirinto de corredores perfurados de nichos. Mais de quatro milhões de tais urnas foram encontradas. Algo realmente fantástico! Num desses corredores, que se aprofundam até 34 metros sob a terra, erguem-se altares consagrados ao deus Thoth por Ptolomeu I (304 a 284 a.C.) e por Alexandre IV (316 a 304 a.C.), filho de Alexandre, o Grande (332 a 323 a.C.). Uma única tumba humana foi encontrada nesse imenso labirinto, a de um sumo sacerdote chamado Ankh-Hor. Grandes íbis de madeira dourada parecem guardar a porta desse sepulcro.

NO DECORRER DO JULGAMENTO DOS MORTOS, o próprio deus Thoth, representado nas ilustrações como um homem com cabeça de íbis, segurando uma pena de escrever e uma paleta de escriba, como se pode ver na ilustração acima num detalhe do Livro dos Mortos do escriba Ani, registrava cada um dos movimemtos da balança que pesava o coração do falecido, à medida em que este recitava 42 frases negando ter cometido uma série de pecados.

O GRANDE POETA PORTUGUÊS Fernando Pessoa cantou as aves do deus Thoth. Veja o que ele escreveu:

Íbis, ave do Egito



O Íbis, ave do Egito
Pousa sempre sobre um pé
(O que é esquisito).
É uma ave sossegada
Porque assim não anda nada.

Quando vejo esta Lisboa,
Digo sempre, Ah quem me dera
(E essa era Boa)
Ser um íbis esquisito
Ou pelo menos estar no Egito.




O Íbis sagrado como manifestação de Thoth e de Maat.
Bronze e madeira dourada do Período Tardio (c. 712 a 332 a.C.).
Museu Kestner de Hanôver.


Para ver mais