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UM HARÉM ORIENTAL A imagem do harém como um local cheio de jovens e lindas mulheres, que passam os dias languidamente reclinadas ou se embelezando para o momento em que o amo apareça para levá-las para a cama, é totalmente falsa. Pelo menos no que diz respeito ao antigo Egito. O que conhecemos hoje sob a denominação de harém, e que os egípcios chamavam de ipet-nesut, era um setor do palácio reservado à acolhida e ao entretenimento das esposas secundárias do faraó e onde se localizava a suite real. Ali se abrigavam, ainda, mulheres solteiras e viúvas da realeza, inclusive as filhas e irmãs do faraó, outras mulheres que faziam parte da família do rei, noivas estrangeiras, mulheres egípcias de alta linhagem e numerosas concubinas de nascimento relativamente humilde, além de servas e crianças. Em outras palavras: o harém era simplesmente o lugar no qual as mulheres viviam. Tendo o faraó vários palácios, era natural que tivesse vários haréns. No dizer da egiptóloga Chistiane Noblecourt, as artes recreativas deviam ser exploradas ao máximo nesses meios femininos de educação e gosto refinados. Música, dança, poesia e todos os artifícios da sedução figuravam entre as preocupações quotidianas.

No Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.) o harém era o local de residência da rainha e nele eram educados os filhos do rei e dos altos funcionários. Na chamada Casa dos infantes reais, damas da nobreza exerciam função de amas, enquanto que preceptores, normalmente generais em fim de carreira, zelavam pelos jovens príncipes e princesas, sob responsabilidade da mãe real. Os jovens filhos de nobres recebiam ali sua formação escolar, lado a lado com os filhos do rei. Da época do faraó Miquerinos (c. 2490 a 2472 a.C.) nos chegou um relato de um certo Ptahshepsés contando que ele foi educado com os infantes reais no grande palácio do rei, na Residência, no harém do rei, sendo apreciado pelo rei mais que qualquer [outra] criança. Quando chegou a época de casar-se, recebeu a filha primogênita do rei como esposa, pois Sua Majestade desejava que ela vivesse com ele mais que com qualquer [outra] pessoa. Nesse período o harém já dispunha de administração própria, mas sua importância econômica ainda era pequena. A literatura dessa épóca cita as belas do palácio ao se referir às mulheres do harém ou esposas secundárias do rei.

Embora não tenhamos testemunho arqueológico de que havia haréns no decorrer do Primeiro Período Intermediário (c. 2134 a 2040 a.C.), sua existência volta a ser atestada no Império Médio (c. 2040 a 1640 a.C.), pelo menos na cidade de Iti-tauí. Nessa época as esposas do faraó eram citadas na literatura como favoritas do rei. No Segundo Período Intermediário (c. 1640 a 1550 a.C.) também não há informações sobre existência de haréns. Já no Império Novo (c. 1550 a 1070 a.C.) os estudiosos supõem que houve haréns pelo menos em Tebas, Mênfis, Tell el-Amarna e Gurob. E devia haver também um harém de acompanhamento, ou seja, um grupo de mulheres que seguia o soberano em seus deslocamentos. Eis porque, ao se preparar para a batalha de Kadesh, Ramsés II ordenou ao seu filho mais velho: Que se afastem as mulheres e as crianças!


A grande porta do templo funerário de Ramsés III (c. 1194 a 1163 a.C.)PORTÃO DE MEDINET-HABU em Medinet-Habu, vista na foto ao lado, que ficava em frente a Luxor, tem uma decoração que, juntamente com a análise histórica de sua construção, leva a crer que essa edificação era um lugar de moradia temporária para algumas das mulheres do harém daquele faraó. Mas nem todos os estudiosos pensam assim. Alguns acreditam que aquela torre de entrada, chamada pelos egípcios de o Grande Lugar Alto, era um local apenas para realização de atos mágicos-religiosos destinados à renovação dos ardores do soberano.

A importância econômica do harém cresceu no decorrer do Império Novo, a tal ponto que sua administração foi entregue a um grupo específico de funcionários chefiados pelo diretor do harém real. Auxiliado por um adjunto, ele comandava um grande número de escribas, como o Escriba da Porta do Harém ou o Guardião das Portas, bem como inspetores e outros funcionários subalternos. Como as esposas secundárias dos faraós, sobre a maioria das quais sabemos muito pouco, exceto que eram sempre muito honradas e respeitadas, podiam atingir a casa das centenas, havia necessidade do emprego de inúmeros artesãos e domésticos. A figura do eunuco, entretanto, ao contrário do que muita gente pensa, não fazia parte desse conjunto de pessoas e parece que eles jamais existiram no Egito, mesmo porque não havia razão para isso.

A Grande Esposa Real auxiliada por uma Superiora do Harém supervisionava as atividades. A rainha Hatshepsut-Merytrê, esposa de Tutmósis III (c. 1479 a 1425 a.C.), por exemplo, ostentava o título de regente das Esposas Reais. Nem sempre, mas podia ocorrer que a esposa principal do faraó residisse no harém com suas filhas menores. Existiam aposentos para elas e para as esposas secundárias do soberano e seus filhos, nos conta Noblecourt, havendo igualmente acomodações para as "favoritas", os "ornamentos reais". Essas últimas, cuja glória durava às vezes o tempo de um capricho, eram paramentadas com uma coroa muito particular, ornada com flores de hastes retas enfiadas num diadema. Os mesmos toucados eram usados pelas filhas do rei quando se tornavam suas esposas.

O harém real típico era formado por uma série de construções de adobe dentro de um muro alto do mesmo material. As dependências circundavam e abriam-se para um pátio descoberto. Construções adicionais proporcionavam espaço para culto e armazenamento. Escavações realizadas em Akhetaton, a Tell el-Amarna atual, trouxeram à luz imagens que representam de forma sintética as dependências dos haréns. Uma pérgola sombreava a porta de entrada da construção. Antes dela havia uma série de muros vigiados por porteiros. A parte principal da habitação era formada por um grande vestíbulo e uma sala central sobrepostos por um terraço sustentado por colunatas com capitéis florais. Em vários outros aposentos secundários, as figuras mostram a rainha e suas filhas não só recebendo aulas de canto e dança, como também aprendendo a tocar alaúde e harpa. Os serviçais que são vistos cuidando da limpeza e de outros afazeres diários são todos masculinos. Pinturas murais nos permitem imaginar o esplendor da decoração dos lugares onde viviam as rainhas e princesas. Guarnições de papiros azulados de onde alçam vôo patos selvagens e arbustos floridos por entre os quais saltam veadinhos. Às vezes mesmo no chão está pintado um vestígio de espelho d´água onde peixes de cores nacaradas roçam lótus desabrochados. No aviário de um dos palácios de Nefertiti a decoração exibe maciços de papiros que aparecem num estilo "impressionista", com as pontas desgrenhadas e inclinadas ao seu próprio peso. É uma vegetação espessa e pontilhada de rolinhas azuis e rosas que parecem se balançar nas hastes, ou com martins-pescadores brancos e negros bicando a base das plantas aquáticas.
Uma indizível poesia desprende-se da atmosfera assim criada: o refinamento, o rebuscamento estético, o gosto pelas tintas nuançadas e alegres deviam ser padrão nessas moradias dedicadas à beleza.
Os utensílios de uso doméstico, como jarros e cerâmicas, não ficavam atrás em beleza: eram revestidos com guirlandas florais na maioria das vezes pintadas num azul cerúleo de luminosa tonalidade. Cofres para armazenamento das roupas ou das jóias vinham do Sudão ou do Oriente Próximo. Incrustrados de marfim ou chapeados a ouro, eram os mais raros da época. Almofadas eram pintadas com verdadeiras miniaturas, coxins de pele de gazela eram enchidos com penugem de rolinhas. Os leitos baixos eram revestidos com cânhamo trançado à guisa de colchões e igualmente decorados. Para completar o mobiliário havia poltronas, sofás, tamboretes e assentos de idêntico bom gosto e requinte.

Para gerar as riquezas necessárias à manutenção de toda essa estrutura havia, além de terras destinadas à exploração agrícola, rebanhos bovinos, pesqueiros, moinhos e oficinas de tecelagem. Cada harém necessitava ter seus próprios bens, formados por terra e camponeses que produziam alimentos para todos e mais alguns excedentes destinados ao pagamento de todas as demais necessidades. Em alguns casos os rendimentos eram obtidos através de impostos. O próprio harém era um centro produtivo. As mulheres mais velhas teciam ou fiscalizavam as oficinas de tecelagem que fabricavam produtos que abasteciam o palácio e eram exportados. Oficinas internas fabricavam os objetos usados pelas mulheres do harém nos seus cuidados com a beleza: recipientes e potes de ungüentos diversos, óleos aromáticos, etc. Também a madeira, o marfim e o vidro eram ali trabalhados em peças delicadas e raras.

A importância política do harém também cresceu no Império Novo. Já no Império Antigo era costume que algumas das mulheres que ali residiam fossem dadas em casamento a altos funcionários da administração real. Isso servia para reforçar os laços de lealdade entre os servidores e o rei. Mas no Império Novo o harém tornou-se o centro da política matrimonial do faraó quando passou a acolher princesas estrangeiras escolhidas de acordo com as considerações da politica externa. Vejamos alguns exemplos dessa prática:

  • No reinado de Tutmósis III foram recebidas três concubinas sírias acompanhadas de 30 escravas.
  • Tutmósis IV (c. 1401 a 1391 a.C.), por sua vez, casou-se com uma filha do rei de Mitanni, Artatama I, não sem antes insistir por carta por sete vezes pedindo a mão da princesa em casamento.
  • Amenófis III (c. 1391 a 1353 a.C.), no décimo ano de seu reinado, mandou emitir um escaravelho comemorativo de seu matrimônio com outra princesa mitaniana, Gilukipa, filha de Shutarna II, rei daquele país. Ela chegou ao Egito trazendo um séquito de 317 mulheres. É mole? Quer mais? Pois saiba que esse faraó também recebeu em seu harém 40 mulheres originárias de Gaza. Ou seja, no mínimo 357 mulheres estrangeiras habitavam no palácio daquele faraó. Além disso, ele era casado com uma irmã do rei dos Cassitas, a quem pediu, mais tarde, a mão de uma filha.
  • Sabemos, finalmente, que Ramsés II (c. 1290 a 1224 a.C.) realizou vários casamentos com filhas de reis estrangeiros, levado pelas difíceis condições da política exterior na sua época.
Embora os reis egípcios aceitassem com alegria filhas de reis estrangeiros como noivas, recusavam-se a enviar suas próprias filhas para casamentos no exterior. Ao solicitar uma esposa ao faraó, um monarca estrangeiro sugeriu que ele enviasse qualquer bela mulher egípcia afirmando tratar-se de uma princesa, porque ninguém saberia a diferença. O faraó recusou-se até mesmo a responder a solicitação.

O harém também desempenhou papel importante na política interna dos faraós. Com tanta gente interagindo nessa instituição, era natural que surgissem rivalidades causadas, principalmente, por lutas de influência entre as favoritas, o que, provavelmente, era muito comum. Mas também ocorreram conspirações para assassinar o faraó. Já na VI dinastia (c. 2323 a 2150 a.C.) um alto funcionário de nome Uni, em sua auto-biografia, nos fala de um processo secreto no harém real contra a rainha, do qual ele mesmo participou como juiz extraordinário. Ele conta que foi chamado sozinho, sem sequer a presença do vizir, para julgar a rainha principal, favorita e esposa do rei Pepi I (c. 2289 a 2255 a.C.), cujo nome, infelizmente, não revela. E diz:

Sua Majestade nomeou-me Adido do Estado em Hieracônpolis (juiz) [pois] ele tinha confiança em mim mais que em qualquer outro servidor. Eu ouvia as disputas, sozinho com o vizir do Estado, em qualquer questão secreta (...) Houve, no harém real, um processo contra a Esposa Real, Grande Favorita, em segredo. Sua Majestade nomeou-me para ouvir [o depoimento], sem que lá houvesse nenhum vizir ou magistrado, unicamente eu, pois eu era capaz, e devido à minha fidelidade ao coração de Sua Majestade, além do que Sua Majestade tinha confiança em mim. Fui eu quem fiz o processo por escrito, sozinho como um magistrado, ainda que minha condição fosse [apenas] a de um Diretor dos empregados do Grande Palácio. Nunca, antes, alguém da minha condição ouvira um segredo do harém real, mas Sua Majestade me fez escutá-lo, pois eu estava capacitado na avaliação de Sua Majestade, mais do que qualquer um dos seus nobres, mais do que qualquer um dos seus servidores, mais do que qualquer um de seus funcionários.
Ao que parece, a Grande Rainha provocou um gravíssimo incidente e o faraó desconfiava de seus altos funcionários. Seu pai já havia sido assassinado pelo corpo de guardas. Um dos conspiradores era o Grande Ecônomo e o papiro que narra a conspiração assim se refere a ele:
O grande criminoso, Paibakhamen, que era então grande ecônomo, foi preso porque havia conspirado com Tiyi e as mulheres do harem; ele havia se juntado a elas; ele havia começado a difundir as palavras delas entre suas mães, pais e irmãos, conclamando: "Sublevem o povo! Excitem a hostilidade", para fomentar uma rebelião contra seu Senhor. E ele foi levado diante dos magnos funcionários da Corte de Inquirição. Eles examinaram seus crimes; concluíram que ele os havia praticado.
O nome da rainha não é citado porque ela caíra em desgraça. Ao final ela desapareceu, banida ou obrigada a suicidar-se, e o rei casou-se sucessivamente com duas Grandes Esposas Reais. Cada uma delas lhe deu um herdeiro que lhe sucederam: primeiro Merenre (c. 2255 a 2246 a.C.) e depois Pepi II (c. 2246 a 2152 a.C.).

O assasinato de Amenenhet I (1991 a 1962 a.C.), primeiro faraó da XII dinastia, teve como ponto de partida uma intriga palaciana desenvolvida em seu harém, na qual estavam envolvidas algumas mulheres do palácio. Era o início do século XX antes da nossa era — ensina Noblecourt — e eis que no sétimo dia do terceiro mês da estação Aket, no trigésimo ano de seu reinado, esse fundador da XII dinastia morreu assassinado. A partir dos sábios cálculos de astrônomos e matemáticos, era exatamente 15 de fevereiro de 1962 antes da nossa era. Posteriormente o fato foi narrado pelo herdeiro do trono, Sesóstris I (1971 a 1926 a.C.), que criou um texto pseudo-autobiográfico, conhecido como Instrução de Amenenhet I, no qual seu pai narra como foi morto:

Foi após a ceia noturna, quando veio a noite, que tirei uma hora de repouso, estendido no meu leito: eu estava fatigado e meu coração começara a acompanhar o sono. Subitamente, perceberam-se ruídos de armas e ouvi palavras a meu respeito, ainda que eu permanecesse como uma serpente do deserto. Despertei pronto para o combate, [mas] eu estava só e tratava-se de um ataque da guarda. Se eu diligenciasse com minhas armas na mão, teria podido expulsar os conspiradores, mas ninguém é forte durante a noite, ninguém pode combater sozinho. Não há qualquer saída vitoriosa sem um protetor.
Outros detalhes daquilo que ocorreu estão narrados no Conto de Sinuhe, um clássico da literatura dessa época.

Uma enorme conspiração do harém contra o faraó Ramsés III ficou registrada em vários documentos, entre os quais se inclui um processo contra os conjurados. O movimento aconteceu no assim chamado harém de acompanhamento, ou seja, no grupo que seguia o rei nos seus deslocamentos. Tudo parece ter sido gerado pelo fato do faraó não ter incluído a mãe do seu primogênito entre as suas Grandes Esposas Reais. Na época do processo sua esposa principal chamava-se Ísis e era sua meia-irmã ou sua filha. No que diz respeito à sucessão havia uma situação nebulosa e uma das esposas, de nome Tiyi, resolveu agir em favor de seu filho, o qual aparece nos documentos sob o nome de Pentaur. Essa intrigante mulher organizou uma verdadeira rebelião cujo objetivo final era o assassinato do rei. Ela conseguiu a adesão de dois camareiros-mór, de um mordomo e de um terceiro camareiro de nome Mesedsure, o qual fazia os contatos com o mundo exterior ao harém. Esse homem instruia sua mãe e seus irmãos a incitarem o povo a preparar as hostilidades contra o faraó. Outra mulher do harém, de origem núbia, escreveu a seu irmão e pediu: Reuni o povo, tornai impopular nosso Senhor e incitai os inimigos à rebelião. O movimento se alastrou e até o chefe do exército aderiu à causa. Os documentos relacionam 28 homens envolvidos na conjura e um grupo bem maior mas não definido de mulheres. O crime deveria ocorrer durante a Bela Festa do Vale que se realizaria em Tebas.

Todos os meios foram utilizados pelos conspiradores; — afirma Noblecourt — nem mesmo a magia foi esquecida. É assim que um certo "Superior dos rebanhos, Penhoruben", providenciou-lhes um rolo de escritos mágicos... provindos da biblioteca do filho real e escondido graças à cumplicidade dos escribas da Casa da Vida. A partir das indicações fornecidas por esse "manual operatório", foram confeccionadas figuras de cera e misturados filtros de amor que deviam ser clandestinamente introduzidos no palácio pelos cuidados do mordomo, a fim de tornar cegos e paralisados aqueles a quem se queria neutralizar. De fato, a título experimental, vários funcionários já se tinham tornado impotentes. Outros especialistas "pontífices" nessas práticas tinham sido contatados, como um sacerdote de Sekhmet, essa grande força que, através de seus "emissários", principalmente durante os cinco dias epagômenos do ano, fazia o Egito e... a Coroa correrem os mais terríveis perigos, inclusive a peste.

Descoberta a conjura, Ramsés III instituiu um júri de exceção formado por doze funcionários da Corte. Entre eles não se incluia o vizir, mas figuravam oficiais do exército e membros regulares do tribunal central. Havia dois juízes de origem estrangeira, um deles asiático, provavelmente porque alguns dos acusados não eram egípcios. Esse júri tinha poderes para dar o veredito, estabelecer as penas e executá-las. Os documentos do processo contra os conspiradores parecem indicar que Ramsés III constituiu o tribunal investigador depois de morto, já que ele afirma estar na presença de Osíris. A atuação póstuma de um faraó era uma coisa admitida no antigo Egito, pois um oráculo poderia transmitir suas ordens a seu sucessor. O faraó afirmou que nada queria saber sobre o caso, mas pedia que se fizesse brilhar a verdade, que os culpados fossem condenados, mas que houvesse extremo cuidado para não punir inocentes.

Como era de praxe, durante o processo os acusados não foram citados pelos seus nomes, mas por nomes infamantes para que suas identidades fossem suprimidas. Mesedsure, por exemplo, significa Ré o abomina e outros implicados receberam nomes como o Demônio, Malvado em Tebas e Ré o Cegará. Os indiciados foram divididos em grupos, de acordo com os crimes que lhes eram imputados, e julgados em conjunto. O primeiro grupo, formado por 17 pessoas, havia ajudado diretamente a rainha Tiyi a fomentar tumultos entre o povo. Entre elas estava Mesedsure, o mordomo, um administrador do tesouro real, dois escribas da Casa da Vida, um sacerdote chefe leitor e o sacerdote de Sekhmet. Foram todos, provavelmente, condenados à morte. Dois outros grupos eram formados por altas personalidades corruptas, entre as quais se incluia o príncipe Pentaur que foi condenado a se suicidar, de acordo com o costume para os casos de delitos cometidos no seio da família real. Para os criminosos de alta hierarquia havia um código de honra pelo qual eles eram condenados mas não sentenciados. Nesse caso se escreveu que eles foram considerados culpados e deixados entregues a si mesmos no Lugar das Execuções. Eles mesmos tiraram a própria vida, não lhes foi imposta nenhuma pena. No que diz respeito a Tiyi parece que ela não foi julgada por esse tribunal, tendo o faraó cuidado pessoalmente de regulamentar seu caso.

No decorrer do processo vários conspiradores que não tinham sido presos, inclusive o chefe do exército, tentaram reverter o resultado a seu favor influenciando os juízes. Três magistrados e dois oficiais de polícia pertencentes ao júri envolveram-se em orgias na casa de um deles, das quais participaram um dos mais importantes réus, mulheres do harém acusadas e mulheres de conspiradores. Presos e processados, um deles foi absolvido por falta de provas, outro foi obrigado a suicidar-se e quanto aos três restantes foi dada contra eles a sentença de que se lhes cortassem os narizes e as orelhas, porque haviam esquecido as boas instruções que lhes haviam sido dadas.