O SOL NO HORIZONTE


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DURANTE O primeiro grande período da civilização egípcia, o Antigo Império [c. 2575 a 2134 a.C.], — escreve o arqueólogo Alan W. Shorter — quando o Egito se constituiu pela primeira vez em estado integralmente organizado, o deus-Sol era adorado como líder dos deuses, pai legítimo do faraó reinante, criador de todas as leis e entidade de quem emanava toda a autoridade visível. Era natural, portanto, que a mente egípcia concebesse uma estreita ligação entre o deus-Sol e Maat, o princípio da verdade, da justiça e da correta ordenação do universo.
governava nos céus como um soberano divino, contrapartida celestial do faraó, monarca que legislava aos homens tanto como aos deuses com absoluta justiça. Dizia-se que ele vivia junto da verdade (Maat) e tudo que infringisse esse princípio era considerado odioso aos seus olhos, sendo que, na outra vida, ele exigiria dos homens, antes de admiti-los às regiões celestiais, que prestassem conta de seus atos. A justiça de Rá tornou-se assim um forte incentivo para que todos os homens vivessem uma vida direita, de acordo com os padrões da época, sendo que, pelo menos em teoria, cada indivíduo se dispunha a agir cuidadosamente, tendo em mente "aquela balança na qual Rá pesa a verdade todos os dias."

UMA DAS FORMAS QUE O DEUS-SOL ASSUMIA era a de Rá-
-Harakhti
, Ra-Heru-akhty em egípcio, cujo nome significa Hórus no Horizonte. Essa divindade era representada como um falcão ou como um homem com cabeça de falcão e entendida como manifestação do Sol ao surgir e se pôr, tendo centro de culto em Heliópolis. Aparecia vestida com o sudário e com um grande disco solar sobre a cabeça, do qual se projetava a serpente uraeus. Um símbolo da deusa Maat como uma pluma (na figura ao lado) ou uma base (na figura acima), geralmente figuravam na representação do deus. Segundo nos explica a egiptóloga Elisabeth Delange, Rá-Harakhti, é a manifestação do Sol flamejante, no apogeu de seu poder, cujo curso está incessantemente ameaçado por forças destrutivas. Maat assinala a vitória do Sol, seu triunfo sobre o adversário. Filha de Rá, o astro divino se alimenta dela. "Rá, Senhor de Maat, vive de Maat, e jubila por ela".

A ESTELA VOTIVA CUJA FOTO VEMOS no topo da página é feita em calcário policromado e mede 43 cm de altura por 28,5 cm de largura, sendo provavelmente da XXVI dinastia (664 a 525 a.C.), e se encontra atualmente no Museu do Louvre. Nela o egípcio Irtyrtsha, sacerdote de Osíris e ourives da casa de Amon, adora a imagem de Rá-Harakhti, o qual era muito venerado nesta época. A divindade aqui aparece mumificada, com o grande disco solar adornando sua cabeça de falcão, com os pés sobre a base de Maat e segurando um cetro was. Na pequena mesa de oferendas surgem dois símbolos essenciais: a ânfora de água e a flor de lótus, esta lembrando o relato da primeira manhã da criação em que o Sol eclode da flor do nenúfar. Por sobre os personagens aparece o disco alado, o qual também abarca o texto. Nele se lê que Harakhti, senhor do céu, recebe oferendas e provisões em abundância para Irtyrtsha, filho do ourives da casa de Amon, Hor, neto de um mesmo ourives Khetefnakht.

ESSE OURIVES PERPETUA UMA DEVOÇÃO POPULAR, que já era milenar em sua época, a uma divindade que proporciona a ressureição. Esse Rá-Harakhti mumificado a exemplo da maneira como Osíris era representado demonstra o sincretismo da religião egípcia. Esse amálgama entre os dois deuses, que conheceu uma longa trajetória desde o Império Novo (c. 1550 a 1070 a.C.), se acentuou nesse Período Tardio (c. 712 a 332 a.C.) em que a estela foi esculpida e o deus solar e Osíris foram completamente assimilados em seu destino comum de ressureição. Já a foto acima exibe um detalhe de um friso de madeira e vidro, do Período Tardio, pertencente ao Museu do Louvre, no qual a mesma imagem é repetida cinco vezes ao lado de cinco cobras naja (uraeus). Tal friso era destinado, provavelmente, a ser encaixado no topo de um mobiliário precioso de algum templo.

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