O CARNEIRO DO DEUS AMON


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ESFINGES DE AMON EM KARNAK AMON ERA O grande deus de Tebas, de origem incerta. Seu nome significa O Oculto. Originariamente talvez tenha sido uma divindade do ar e do vento, primeiro elemento cósmico a receber a vida no caos informe que prevalecia antes do universo ganhar forma. Posteriormente adquiriu fisionomia própria. Era representado como um homem barbado, usando na cabeça uma touca encimada por duas longas plumas, às vezes com o membro sexual ereto, o que sublinhava suas faculdades generativas, empunhando na mão direita erguida um cetro em forma de látego. Seus animais sagrados eram o carneiro de chifres curvos e o ganso. Seu santuário principal ficava em Tebas, no Alto Egito, e até hoje podemos admirar as esfinges da avenida das procissões do templo de Amon em Karnak, com seus corpos de leão e cabeças de carneiro. Entre as patas as esfinges têm uma estátua da divindade ou do faraó, protegendo-os de influências maléficas.

O EGIPTÓLOGO JOHN WILSON assim se refere a essa divindade:
O nome Amon significa "Oculto" de maneira que Amon era um deus invisível, um deus que podia ser imanente por toda parte. Segundo um antigo sistema teológico, Amon, como invisibilidade, era um dos oito deuses do caos anterior à criação. Assim, podia ser invisível e informe, ou o deus do ar. De qualquer modo, enquanto ser cósmico, podia ser transplantado facilmente de um sistema teológico para outro como deus de ação muito extensa. Chegou a substituir os deuses tebanos anteriores e a atuar como o deus de toda a nação. Com esse poder foi enxertado no deus-Sol, Rá, como "Amon-Rá, Rei dos Deuses". Como deus da nação egípcia, se converteu no grande deus imperial com o Império Novo (c. 1550 a 1070 a.C.) e assim assumiu um caráter universal. Há uns quatro mil anos foi construído para ele o templo mais sólido de todos os tempos, o de Karnak, com as amplas construções erguidas desde o Império Médio (c. 2040 a 1640 a.C.) até a época romana (30 a.C. a 395 d.C.). No final do Império Novo chegou a ser a mais rica potência do mundo e o poder de seu sumo sacerdote rivalizava com o do faraó. Foi no começo da XII dinastia, por volta de 1991 a.C., que essa divindade saiu da obscuridade cósmica para começar sua impressionante carreira.

PELO FATO DE SER UM DEUS DE TEBAS, conforme nos ensina o renomado egiptólogo Alan W. Shorter, ele não ocupou posição de destaque durante o primeiro grande período da história egípcia. Quando, entretanto, o trono passou para uma família originária de Tebas, os faraós do Império Médio, o deus local alcançou grande prestígio. Mais tarde, quando os príncipes tebanos da XVII dinastia (1991 a 1783 a.C.) conseguiram livrar-se do jugo odioso dos hicsos (estrangeiros que haviam invadido o país por ocasião do colapso do Império Médio), viram em Amon o artífice de sua vitória. A partir de então, a influência de Amon cresceu incessantemente e, quando o Egito estendeu o seu império à Ásia e ao Sudão, esse deus passou a ser precisamente o símbolo de tal poderio.

DEUS AMON-RÁ MAS NENHUMA DEIDADE QUE aspirasse à posição de deus nacional podia ter esperança de sucesso se não estivesse em harmonia com o vasto corpus da doutrina solar, na qual se baseava o sistema monárquico egípcio. Foi necessário, por essa razão, que o clero de Amon o identificasse com o deus-Sol — após o que se tornou Amon-Rá — e que o todo da doutrina solar lhe fosse aplicado, para que daí em diante ele passasse a ser considerado em tudo idêntico ao próprio . Rá era o deus criador de todas as coisas. Ele era o deus supremo da doutrina religiosa da cidade de Heliópolis. Sempre foi considerado o mais importante de todos os deuses egípcios e assim continuou sendo ao longo de toda a história egípcia. Alan Shorter também escreveu: A evolução dos acontecimentos políticos podia, por um certo tempo, conferir prestígio a outras divindades, mas no fundo a teologia solar jamais deixava de exercer a sua influência no sentido de fazer com que os outros sistemas se adaptassem a ela. Assim, com o sincretismo das duas divindades, Amon-Rá, representado na ilustração acima, tornou-se deus nacional do Egito a partir da XVIII dinastia (c. 1550 a 1307 a.C.). Um hino egípcio, citando Punt e Mejayu, terras do incenso e das essências aromáticas, louva a divindade e enaltece seu doce perfume:

Aquele de natureza mais nobre que qualquer outro deus, ante cuja beleza os deuses se regozijam. Aquele a quem se louva na Grande Casa, a quem se coroa na Casa do Fogo. Aquele cujo doce perfume os deuses tanto apreciam, quando chegado de Punt. Exuberantemente perfumado, quando chegado da terra de Mejayu. A face formosa, quando chegado da terra do deus.
A IMPORTÂNCIA DE AMON REFLETIA-SE ATÉ no nome dos faraós. Foi assim que na XVIII dinastia quatro reis foram chamados de Amenófis (Amen-hotep), que significa Amon está satisfeito. A esposa de Amenófis I, Aahmes-Nefertari era considerada esposa de Amon. Ela dormia no templo e suas crianças eram tidas como filhos e filhas do deus. A esposa do sumo sacerdote era a concubina de Amon. Foi Amenófis I que estabeleceu as bases do culto de Amon em Tebas e ele também iniciou a edificação das magníficas construções de Karnak, ampliadas por seus sucessores, a qual se transformou na maior estrutura religiosa jamais construída pelo homem. Muito do seu reinado de apenas 10 anos foi dedicado em parte ao estabelecimento da nova religião nacional.

AMON E AAHMES COM SUA ESPOSA Mut e seu filho Khons, Amon formava a tríade dos deuses tebanos, mas também tinha centros de culto em Hermópolis, Tanis e Mênfis. Na sua identificação com o deus-Sol, acreditava-se que fosse, fisicamente, o pai de todos os faraós, os quais, na qualidade de sucessores, recebiam o trono de suas próprias mãos. Para gerar seu herdeiro, Amon tomava as feições do faraó reinante e visitava a rainha enquanto esta dormia em seu palácio. Numa inscrição existente no templo de Hatshepsut, em Deir el-Bahari, o procedimento é descrito. Ao lado vemos a ilustração que acompanha o texto e que mostra, metaforicamente, esse encontro. Na figura a divindade aproxima da narina da rainha o símbolo da vida. Referindo-se a esse encontro de Aahmes, mãe de Hatshepsut, com o deus, o texto diz:

Ele a encontrou quando ela repousava em seu magnífico palácio. Ela acordou com o perfume do deus e sorriu para sua Majestade. Ele avançou direto para ela e a desejou grandemente, deu-lhe seu coração e fez que ela o contemplasse em seu aspecto divino, após ter vindo até ela. Ela se regozijou com a sua beleza, e o amor dele passou para o seu corpo; o palácio exalava o perfume do deus e seu aroma era em tudo idêntico ao de Punt.
QUANDO O IMPÉRIO EGÍPCIO SE EXPANDIU, Amon tornou-se um deus da vitória, a deidade que encorajava seu filho, o faraó, a prosseguir nas campanhas que dominariam todas as nações, tornando-as tributárias da divindade, do rei e do Egito. Vários relevos nas paredes dos templos mostram o faraó vitorioso sacrificando prisioneiros de guerra em presença do deus, golpeando suas cabeças com uma clava de pedra ou liderando o cortejo dos chefes capturados. Amon também orientava o faraó nos rumos a tomar e ordenava submissão aos inimigos. Na Estela da Vitória de Tutmósis III (c. 1479 a 1425 a.C.), atualmente no Museu do Cairo, podemos ler as determinações do deus:
Resolvi ordenar a ti que esmagues os príncipes da Palestina;
Fiz que se prostrassem aos teus pés por todos os recantos de seus países.
Ordeno-lhes que contemplem tua majestade de Senhor do Esplendor, o teu brilho em suas faces são como imagens minhas.
CONFORME NOS ENSINA E. A. WALLIS BUDGE, no decorrer da XIX (c. 1307 a 1196 a.C.) e XX (c. 1196 a 1070 a.C.) dinastias Amon era encarado como um poder criador invisível, fonte de toda a vida no céu, na terra, nas águas e no mundo do além-túmulo, e que se fazia manifestar sob a forma de Rá. Se acreditarmos no que dizem os textos antigos como, por exemplo, um poema que retrata a batalha de Kadesh, Amon era um deus que não abandonava seus fiéis. Nessa luta travada por Ramsés II (c. 1290 a 1224 a.C.) contra os hititas, quando o faraó se viu sozinho e cercado pelos inimigos, em desespero dirigiu-se à divindade e ela replicou:
Avante, avante! Eu, teu pai, estou contigo! Minha mão está junto a ti e eu valho mais que cem mil homens! Eu, o senhor da vitória, a fonte da força!
Animado por tais palavras, Ramsés II se encheu novamente de coragem e lançou um ataque tão devastador contra o inimigo que este se viu acuado. O faraó exclamou:
Sou como Montu! Atiro setas com a mão direita e digladio com a esquerda! Estou à tua frente, como Baal na sua hora! Vejo que as duas mil carruagens, no meio das quais me encontrava, foram despedaçadas após a passagem dos meus cavalos!
A INFLUÊNCIA DE AMON CRESCEU de forma continuada não apenas no Egito, mas também no exterior. Às vezes o sumo sacerdote do deus em Karnak se autonomeava chefe de todos os sacerdotes do país. A força desse homem era muito grande: a ele cabia administrar os ricos tesouros e bens do templo de Amon e podia chegar mesmo a ocupar postos civis da mais alta importância, como o de vizir, por exemplo. Boa parte das rendas do Estado e dos despojos das campanhas de conquista foram consagradas àquele deus. Além disso — explica Alan Shorter —, seus domínios não se restringiam unicamente ao Egito, mas incluíam três cidades do Líbano. Sua fama chegava a todos os cantos; em Canaã, ele era tão adorado quanto Baal ou Astartéia, e templos eram erguidos em sua honra em cidades da Síria, da Palestina e, bem ao sul, na Núbia e nos mais variados lugares, como em Napata, que estava destinada a se tornar o baluarte do culto ao deus nos últimos anos da história egípcia. Amon tinha se tornado o deus supremo do Egito e também do império egípcio, que abarcava boa parte do mundo então conhecido. Em consequência, uma concepção mais abrangente, mais universal do que era um deus começou a surgir: Amon-Rá era o criador e pai de toda a humanidade e não apenas dos egípcios. Ele, segundo o Grande Hino a Amon, era
Atum o criador da humanidade, aquele cuja natureza se distinguira por ter se concebido a si mesmo; aquele que tornou as cores dos homens diferentes umas das outras.

AMON FALAVA ATRAVÉS DE ORÁCULOS, sendo que um dos mais célebres ficava em Siwa, no deserto líbio. Foi aí que Alexandre Magno — diz a lenda — ouviu do próprio deus a confirmação de que era seu filho. Os gregos identificaram Amon com Zeus e os romanos com Júpiter.

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